sábado, março 14, 2009

Fracasso da Nova Declaração sobre Drogas da ONU é exposto na rede

Nos dias 11 e 12 de março 2009, o Comitê de Alto Nível da Comissão de Estupefacientes (CND) da ONU se reuniu em Viena para avaliar a implementação da declaração política e dos planos de ação da sessão especial da Assembleia Geral das Nações Unidas (UNGASS), realizada em 1998. A avaliação teve início em 2008, e irá determinar a política internacional de drogas para a próxima década.

As semanas que antecederam o evento foram marcadas por diversas manifestações na mídia que evidenciam a quebra do consenso internacional sobre a estratégia a ser usada no controle do uso das drogas. Notícias sobre a inadequação do conteúdo da declaração a ser apresentada no evento povoaram a mídia internacional, e hoje podemos encontrar na rede inúmeras manifestações contrárias ao texto da declaração adotado pela ONU.

A Human Rights Watch, a Sociedade Internacional sobre Aids, e a Associação Internacional de Redução de Danos afirmaram que a nova Declaração das Nações Unidas sobre Política de Drogas carece de medidas que seriam extremamente importantes para tratar e travar o alastramento do HIV.
"As delegações de Governo poderiam ter utilizado este processo para fazer um balanço daquilo que tem falhado na última década nas estratégias de controle da droga, e para criar uma nova política internacional de drogas que reflila as presentes realidades e desafios. Em vez disso, eles produziram uma declaração que não só é fraca - é realmente prejudicial aos direitos humanos fundamentais de saúde e obrigações", disse o Prof Gerry Stimson, diretor executivo da Associação Internacional de Redução de Danos.
O episódio revela a absoluta falta de consenso em torno do texto aprovado, materializada na manifestação da representação da Alemanha, que falando em nome de países como Australia, Bolivia, Bulgaria, Croacia, Chipre, Estonia, Finlandia, Georgia, Grécia, Hungria, Latvia, Lichtenstein, Lituania, Luxemburgo, Malta, Holanda, Noruega, Polônia, Romênia, Santa Lucia, Eslovenia, Espanha, Suíça e Reino Unido, afirmou que estes países irão interpretar o termo "related supported services" (serviços relacionados apoiado) contido na declaração como indicativo do apoio da ONU a ações de reduções de dano já em curso por parte destes governos.

Russia, Colombia, Argentina, Cuba, EUA, Sri Lanka, e Japão foram os países que se opuseram à manifestação dos alemães. Seria importante saber como a delegação brasileira se comportou em relação à declaração apresentada pela ONU.

O que está em questão neste caso é um conjunto de medidas conhecidas coletivamente como "serviços de redução de danos", que foram aprovadas pelas agências de controle de saúde e consumo de droga da ONU, incluindo o Gabinete das Nações Unidas contra a Droga e o Crime, a ONUSIDA e a Organização Mundial de Saúde. Estas medidas incluem troca de agulhas e seringas e medicação-terapia assistida (por exemplo, com metadona), tanto dentro como fora da prisão, como essenciais para tratar o HIV entre as pessoas que usam drogas. O grupo observou que inúmeros elementos comprovam que a redução dos danos é essencial à prevenção do HIV para as pessoas que usam drogas. O texto aprovado vai em direção contrária à assessoria direta do UNAIDS, o Fundo Global de Luta contra a AIDS, Tuberculose e Paludismo, e os relatores especiais das Nações Unidas em matéria de saúde e sobre a tortura.

A Human Rights Watch afirma que a declaração falha também em termos de direitos humanos. Em inúmeros países em todo o mundo, a aplicação da lei tem resultado em práticas abusivas realizadas sob a bandeira da "guerra contra as drogas", causando extensa e muitas vezes terríveis violações dos direitos humanos. Além disso, interpretações demasiado restritivas dos tratados internacionais de controle de drogas podem resultar, a nível nacional, na negação de acesso a medicamentos e analgésicos essenciais para dezenas de milhões de pessoas no mundo inteiro.
"Dada a ampla difusão de violações dos direitos humanos em todo o mundo diretamente resultantes da aplicação das leis anti-drogas, o respeito pelos direitos humanos devem estar presentes no cerne da política da ONU para drogas. Mas a declaração da ONU faz pouca referência a obrigações jurídicas internacionais dos Estados-Membros no âmbito dos direitos humanos, e também não sublinha o respeito pelos direitos humanos na execução da política de drogas", disse Joseph Amon, diretor da divisão de saúde e direitos humanos da Human Rights Watch.
As organizações também declaram que "a comunidade internacional deve reconhecer que a atual abordagem da política internacional de drogas falhou". Medidas concretas devem ser tomadas para que seja estabelecida uma política de drogas que incorpore medidas resultantes da análise de evidências do que realmente acontece, e dessa forma tratar o consumo de droga e os danos relacionados com direitos humanos como obrigações dos Estados, e também das Nações Unidas como organização internacional. Isso significa apoiar as medidas de redução dos danos. Significa reconhecer que políticas de drogas punitivas não funcionam, e têm gerado graves efeitos na vida e na saúde de milhões de pessoas. Significa, também, reconhecer que precisamos de um novo caminho.

Vale acompanhar a discussão que está acontecendo neste momento na rede -- o blog 'sobre drogas' da globo.com faz boa cobertura do debate, e o CDNblog da IHRA monitora a reunião da ONU em tempo real. Para ilustrar o movimento, apresento abaixo um vídeo produzido pela Organização de Liberdades Civis da Hungria, que acompanhou o evento em Viena e propõe um programa que utiliza um projeto de vídeo colaborativo para colher impressões de especialistas sobre o assunto.



Abaixo, video produzido pela Open Society Institute -- Animated Report 2009 -- apresenta os efeitos desastrosos da política de drogas nos últimos anos, e propõe soluções para o futuro.