segunda-feira, agosto 15, 2005

Planta proibida - perseguição denunciada

Nunca vi uma explicitação tão evidente da escalada de distorções que ilustram a perseguição sofrida pela planta cannabis nos últimos 80 anos. Em artigo publicado recentemente na revista online Nuvo, (Cannabis Cure: Miracle or Myth?) Laura McPhee coleciona citações de famosos estudos oficiais sobre o tema, e demonstra como os verdadeiros resultados foram rechaçados e / ou distorcidos de acordo com a agenda política, criando as condições para este tremendo mal-entendido em nossa civilização que é a criminalização do uso da cannabis. Ao examinarmos os fatos percebemos claramente que os mais comuns e perigosos mitos e inverdades sobre a substância ilegal mais utilizada no mundo são concebidos e difundidos pelo governo americano, em desacordo com as descobertas oficiais.

Através da ação internacional do DEA, ainda hoje o mundo é forçado e decorar esta cartilha:

"A maconha é uma droga perigosa e altamente viciante, que coloca a saúde dos usuários em signitivativo perigo. A maconha não tem nenhum valor medicinal que não possa ser promovido de forma mais efetiva através de outras drogas. Os anti-proibicionsitas usam a maconha medicinal como estratégia para advogar a legalização geral do uso de drogas."

Em 1936 o filme Reefer Madness (vale à pena assistir) inaugura a perseguição mostrando como apenas uma tragada da fumaça maldita pode levar jovens sadios a uma escalada de violência e luxúria que resulta em morte e insanidade. Apesar da declaração de que os fatos narrados no filme não apresentavam nenhuma relação com pessoas ou situações reais, o filme explicita que cumpre a missão de informar a população incauta sobre o 'novo inimigo público número um' (veja ao lado). O "Marijuana Tax Act", que proibiu a posse, venda e qualquer tipo de uso da cannabis, surge logo em seguida, em 1937, mesmo com a oposição da AMA (Associação Médica Americana).

A década de 70, que viveu a ressaca dos anos rebeldes marcados pelos movimentos contra-culturais, assistiu à sinalização positiva de vários setores da sociedade americana em favor de uma revisão desta abordagem proibicionista. O famoso estudo de 1972 da 'National Commission on Marihuana and Drug Abuse', formada por especialistas e congressistas convocados pelo então presidente Nixon, sugeria no relatório final que "deveríamos desenfatizar a maconha como um problema" e afirmava que "o uso de drogas por prazer ou outros motivos não-medicinais não são inerente irresponsáveis". Tal resultado certamente não atendeu à agenda política da época e foi totalmente ignorado pelo governo -- o período que se seguiu foi marcado por grande censura à pesquisa com psicoativos.

Em 1988, após 4 anos de estudos envolvendo centenas de testemunhas e milhares de páginas em documentação, Francis Young, Chefe do Depto. Jurídico do DEA publicou relatório onde sugeriu uma reclassificação de periculosidade da cannabis declarando: "é razoável concluir que existem utilizações seguras para a maconha sob supervisão médica -- afirmar o contrário constitui claro erro de julgamento". Novamente os estudos oficiais foram desconsiderados, e aproximadamente 10 anos depois o drug-czar do presidente Clinton (Barry Macfrey), afirma
à imprensa
que "não existe nenhum traço de evidência científica sobre segurança ou benefícios medicinais da maconha.".

Enquanto isso, na Europa, pesquisa encomendada pelo governo inglês em 1996 registrou parecer que também recomendava a reclassificação da substância, indicando que "os malefícios não devem ser superestimados: a cannabis não é venenosa e não apresenta algo grau de adição". E o National Institute of Health (EUA) promoveu em 2001 workshop sobre as possíveis utilizações médicas da cannabis, e dentre as conclusões afirma que podem existir casos específicos de pacientes onde o uso da cannabis (a fumaça) supera em resultados os medicamentos que utilizam o princípio ativo (thc) em cápsulas. (Parece clara a distinção americana entre drogas legais e ilegais - tomar uma pílula sintética, ineficaz e cara é aceitável para a medicina, fumar a planta cannabis para aliviar sintomas da AIDS, da quimioterapia, da esclerose múltipla e de uma variedade de síndromes debilitantes é errado e imoral).

A conclusão óbvia frente aos resultados dos estudos oficiais, mesmo quando patrocinados por governos proibicionistas, é que a cannabis apresenta riscos mínimos para a grande maioria de seus usuários, e é capaz de prover benefícios à saúde de pacientes em situações específicas. Fica claro também que o discurso proibicionista não tem nenhum compromisso com a verdade científica, e se aproxima bastante da abordagem que gerou o filme 'Reefer Madness' -- identificar um 'inimigo público'. O tema está em aberto para discussão...

Aqui no Brasil, por enquanto, estamos apenas 'aceitando' as regras impostas pelo patrão, sem qualquer opinião ou pesquisa própria. Sem ao menos avaliar os usos culturalmente desenvolvidos. Até quando?

Bônus link: 'A história da "Cannabis": Saiba como a maconha tornou-se ilegal'