terça-feira, dezembro 27, 2005

Raves no Brasil: ônibus para levar usuários para a prisão

Este foi um mês fantástico para as divisões policiais encarregadas de reprimir o uso de substâncias ilícitas nas raves brasileiras. Ganharam destaque na mídia ( 1 / 2 / 3 / etc ) as incursões disfarçadas de equipes que ostentam codinomes tais como 'Divisão Clubber', atuando em ações táticas que a mídia divulgou sob o título 'Operação Dancing', e cujo apelo nos títulos e chamadas das matérias era o fato dos detidos por posse e uso de substâncias ilíticas serem levados à delegacia de ônibus -- eram muitos para caber nos camburões. Outro fato interessante, apesar de apresentado com destaque bem menor em todas as matérias, foi o fato de nenhum entre os presos ter sido identificado como traficante.

É difícil saber o que irão fazer com tanta gente na delegacia, e qual o efeito pretendido pela divulgação massiva de tais operações. Mas a declaração de um dos policiais 'clubbers' na matéria da AOL pode ser reveladora:
Meu trabalho é enganar os playboyzinhos. Nada é mais legal do que ver a cara de espanto deles quando estão sendo levados para o camburão. Você precisa ver, é sensacional”, diz Marcos, um dos 11 policiais do Departamento de Investigação sobre Narcóticos (Denarc) que batem ponto na noite paulistana para identificar traficantes(!).
Enquanto o poder público parece se divertir com a autoridade que lhe é conferida por uma legislação inteiramente inadequada para tratar da questão da droga em nossa sociedade, o terceiro setor parece melhor sintonizado para perceber como atuar de forma efetiva nos grupos sociais que obviamente não têm na abstinência uma alternativa para suas programações noturnas. "Não seja um sem noção", é o nome da campanha lançada pela AME (Amigos da Música Eletrônica):
"Tudo começou com a indignação dos membros da AME ao perceber tamanha hipocrisia das autoridades e pataquadas da mídia. Uma equipe de reportagem de TV entrou escondida numa rave e comprou ecstasy, mostrou numa série de reportagens o que eram "festas-rave", verdadeiros "antros de perdição e de drogados". Que tal, então, criar uma campanha que mostre um exemplo típico do cara que dá pano pros comentários dos urubus de plantão? Que tal um cara bem sem noção, que exagera em tudo e queima o filme dele, dos amigos e, conseqüentemente, da festa inteira? Foi assim que surgiu o Sem Noção, personagem central da nossa campanha de redução de danos. Quando a gente chegou neste "ser", achamos que o legal seria mostrar algumas situações constrangedoras, pra que a galera sem noção se reconheça no nosso personagem e se sinta realmente mal por estar estragando a noite de todo mundo. Como fazer isso? Ilustrar essas situações já seria um bom começo..."
AME: O nascimento do 'Sem Noção'
Está mais do que na hora de nossas autoridades perceberem que sua função social é promover a paz e o bem-estar para os cidadãos comuns, e não determinar a forma como devem proceder em seus momentos de lazer. Grave é o fato desta modalidade de intervenção da repressão policial ao uso de substâncias ilícitas estar gerando um número cada vez maior de usuários enquadrados como traficantes.