quarta-feira, junho 14, 2006

Desvelando o debate dos senadores sobre a nova política de drogas

Como anunciado anteriormente, a Ecologia Cognitiva está apresentando trechos do vídeo da sessão da Comissão de Constituição e Justiça do Senado no dia 31/05/2006, quando foi apreciado o Substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei do Senado nº 115, de 2002, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas - SISNAD.

Os resultados e consequências da sessão da CCJ para a formulação da nova política de drogas no país foram abordados e detalhados no post anterior. Nosso objetivo com a divulgação destas imagens é abrir um debate público e abrangente sobre o tema, chamando atenção para alguns aspectos que consideramos importantes:

1) O vídeo demonstra a clara e louvável intenção da maioria dos senadores em aprovar uma nova política de drogas, frente à incapacidade da lei vigente em lidar com as situações reais do consumo e do tráfico de substâncias ilícitas hoje no país.



2) Alguns trechos demonstram a absurda falta de informação dos senadores em relação a questões práticas do tema, principalmente nos argumentos que justificam a emenda que exclui a proposta da Câmara de pena alternativa para quem semeia, cultiva e colhe plantas destinadas à preparação de drogas.



3) A argumentação do Sen. Jefferson Peres indica a impropriedade de se tratar do problema do abuso de drogas na sociedade com a repressão e o proibicionismo, e apresenta uma abordagem moderna e arrojada que deveria ser apoiada e respaldada pelo movimento anti-proibicionista -- de forma que o Senador não mais abrisse suas exposições no tema entitulando-se um 'ET', por supostamente estar apresentando posicionamento isolado e 'exótico' na questão.



4) O fechamento da discussão deste tema na sessão da CCJ apresentou encaminhamento altamente questionável, após o momento em que o Sen. Jefferson Peres assinalou a infração regimental em que incorriam os senadores ao acatar emendas ao projeto nesta fase da tramitação.



Convoco todos os interessados no tema a se manifestarem nos comentários, deixando opiniões de resposta aos argumentos dos senadores, sugestões de ações concretas a serem empreendidas, e tudo o mais o que possa ser considerado útil neste momento importante de mobilização. Solicita-se especialmente a colaboração de profissionais do direito e especialistas em assuntos parlamentares para que possamos traçar os próximos passos da mobilização com o suficiente conhecimento de causa.

Nunca é demais lembrar que esta movimentação é política, e envolve a mobilização dos cidadãos que militam pelo anti-proibicionismo para que se façam representar adequadamente no congresso nacional, buscando os canais legítimos de manifestação e influência nas decisões que irão formatar o futuro do país.

UPDATE (16/06/2006): está disponível aqui a íntegra do registro da sessão da CCJ do Senado que avaliou a 'nova' política de drogas para o país.

quinta-feira, junho 01, 2006

Senado reintroduz prisão para usuário na 'nova' política de drogas

A matéria de "O Globo" apresenta bem a situação em que foi encaminhada a aprovação da 'nova' política de drogas brasileira:
"A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou ontem a reintrodução da pena de prisão para usuário de drogas no projeto que aprimora a Lei Antidrogas, de 2002. A pena, que vai variar de seis meses a dois anos de cadeia, será aplicada ao usuário que não cumprir as penas alternativas: prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programas ou cursos. A versão original do projeto não incluía a prisão dos usuários como punição. Já está prevista também multa para quem não cumprir algumas dessas medidas... A comissão aprovou ainda a exclusão da proposta da Câmara de pena alternativa para quem semeia, cultiva e colhe plantas destinadas à preparação de drogas. Quem for flagrado, por exemplo, com um pé de maconha plantado num vaso será tratado como traficante e preso. As alterações são de autoria dos senadores Demóstenes Torres (PFL-GO) e Magno Malta (PL-ES), conhecidos por posições rigorosas no tema."
CCJ do Senado aprova prisão para usuário de drogas - O Globo
Um projeto leva 4 anos tramitando no congresso, e em apenas uma sessão da Comissão de Constituição e Justiça é completamente desfigurado pela atuação de 2 senadores obviamente mal preparados para lidar com a questão? Isto não pode ser legal... e temos informações de que realmente houve violação do regimento na introdução das alterações de mérito no projeto de lei. A Ecologia Cognitiva manifestou-se diretamente aos senhores senadores:

Prezado Senador,

Tivemos a informação de que aconteceu hoje na CCJ um acordo prevendo que o usuário de drogas que não se submeta às medidas educativas estará sujeito, sucessivamente, a restrição de direitos; se isso não resolver, a multa; e, somente em último caso, à pena de detenção. Isso é um avanço. Mas fico com a opinião do representante do Ministério da Saúde que a classifica de "avanço tímido". Sem dúvida, muito melhor seria prevalecer a redação original que foi proposta, sem qualquer previsão de pena privativa de liberdade.

Porém o que realmente causa espanto mesmo é a pena para "semear, cultivar ou colher". Afinal, aquele que for condenado por posse para uso próprio somente sofrerá privação de liberdade como última alternativa. Já quem "semear, cultivar ou colher" continuará sendo, em princípio, condenado por tráfico, recebendo, portanto, pena pesada. No texto anterior do projeto, essa conduta havia sido expressamente equiparada à posse para uso próprio, ficando, portanto, também sujeita às penas alternativas.

Como o senador deve saber, principalmente em relação à canabis, o uso social positivo só pode acontecer através do cultivo pessoal da planta, que elimina a relação com o tráfico e pode demonstrar a possibilidade da integração social do uso culturalmente regulado. Eliminar esta possibilidade é perseguição política, como de costume, e vai na contramão de outras iniciativas continentais de recuperação e valorização do uso tradicional / medicinal / espiritual de plantas psicoativas.

Portanto, podemos dizer que a 'nova política de drogas' brasileira transformou-se num fiasco. Esperamos tanto tempo para isso? Para sermos traídos pelos senadores da república? Absolutamente não -- algo precisa ser feito. Acredito que seja papel do senador nos ajudar neste momento.

Aqui, uma informação importante que nos foi passada por especialistas nas regras regimentais do senado:

Qualquer alteração de mérito que venha a ser agora introduzida no projeto de lei pelo senado, inclusive essas que foram realizadas na CCJ, é anti-regimental. Isso porque o projeto foi apreciado originalmente pelo senado; depois pela câmara. Agora, ao retornar ao senado, cabe a este, simplesmente, aprovar, rejeitar ou fazer emendas de redação; não emendas de mérito, porque o projeto já foi apreciado pelo senado. Tivemos informações de que os consultores alertaram os senadores para isso, mas não adiantou. Eles atropelaram o regimento para mudar o que queriam.

Isso nos lembra de
outras situações recentes em que projetos de reforma das políticas públicas para substâncias psicoativas foram bloqueados por instâncias alheias aos processos legítimos e representativos, e à revelia da avaliação de autoridades e especialistas.

É importante neste momento que o senador seja vocal em relação à essa violação do regimento pelos senadores, e que auxilie a sociedade civil mobilizada a fazer valer a legalidade nos trâmites da função representativa do congresso nacional.

Aguardo retorno.

Chamo a atenção dos interessados para o fato de que esta movimentação é política -- precisamos de consciência e firmeza para fazer valer nossos direitos de cidadão, e validar a cultura do uso positivo das substâncias psicoativas frente à sociedade.